sábado, 18 de agosto de 2012

Como draftar um quarterback, Parte 1 - Ninguém sabe nada

Esta é a Parte 1 de uma série de 7 posts sobre o assunto.
- Parte 2 - Apenas um
- Parte 3 - O que poderia ter acontecido?
- Parte 4 - Um experimento chamado Kyle Boller



 Por Brian Billick, NFL Network
16 de abril de 2012

O ganhador do Oscar e roteirista William Goldman costuma dizer que há uma importante regra que você nunca deve esquecer para conseguir entender como as coisas funcionam em Hollywood: "ninguém sabe nada".

Quando se trata de futebol americano, esta mesma frase se aplica ao complexo e tortuoso exercício de decidir quem consegue e quem não consegue jogar como quarterback na NFL. Certamente há algo de artístico nisso (mesmo porque todas as tentativas científicas não deram certo).

No final da década de 60, início da era do Super Bowl, sempre que os times draftavam quarterbacks entre as 10 primeiras escolhas do draft (justamente onde espera-se que todos tornem-se excelentes jogadores), as franquias tinham sucesso em apenas 50% dos casos. De forma geral, na primeira rodada de escolhas - onde você espera obter pelo menos um jogador de qualidade que seja titular pelos próximos anos - a média foi idêntica: apenas 50% de sucesso. Às vezes os times acertavam (como quando o Pittsburgh Steelers escolheu Terry Bradshaw com a primeira escolha no draft de 1970) e às vezes erravam (como quando o Chargers escolheu Marty Domres com a nona escolha do draft de 1969). Há também ocasiões em que os times fazem escolhas que, se analisarmos o retrospecto, parecem coerentes. Em 1967, com a terceira escolha do draft, o San Francisco 49ers escolheu Steve Spurrier, da Flórida, vencedor do Heisman Trophy no ano anterior. Na escolha seguinte, o Miami Dolphins selecionou Bob Griese, que simplesmente viria a entrar no hall da fama.

Hoje, mesmo depois de várias décadas de experiência com o draft, um melhor entendimento de todas as qualidades necessárias para se obter sucesso na NFL e com milhões de dólares gastos com olheiros e avaliação de talentos pelo país afora, os times ainda acertam em apenas 50% dos casos na tentativa de identificar futuros quarterbacks de talento nas primeiras 10 escolhas do draft, e o mesmo ocorrendo no restante da primeira rodada do draft.
Eis duas das razões para isso:

1. Quarterback é a posição mais difícil de jogar entre todos os esportes coletivos no mundo. Não existe outra posição - arremessador no baseball, goleiro no futebol ou armador no basquete - que exija uma mistura de habilidade atlética, inteligência, concentração mental e ainda um "algo a mais" que Hemingway certa vez descreveu como "grace under pressure" - seria algo como manter a calma e a frieza nos momentos mais difíceis.

2. É a posição mais difícil de avaliar e projetar entre todos os esportes profissionais no mundo. Os times da NFL, mesmo munidos de três ou quatro anos de gravações de jogos, centenas de páginas de avaliação por profissionais, dezenas de horas de trabalhos físicos e técnicos ao vivo no Combine, trabalhos individuais reservados, além de várias entrevistas pessoais, ainda assim erram de forma rotineira na escolha do quarterback.

Desde 1998, 17 quarterbacks foram selecionados na primeira, segunda ou terceira escolha do draft. Certamente há nomes especiais nessa lista - Peyton Manning, Eli Manning, Donovan McNabb. Há nomes promissores também - Matt Ryan, Matthew Stafford, Cam Newton. Mas também estão nesta lista nomes como Ryan Leaf, Tim Couch, Akili Smith, David Carr, Joey Harrington e JaMarcus Russell. O que esse último grupo de jogadores têm em comum? Os treinadores que estavam no comando das equipes quando esses atletas foram selecionados não estão mais empregados nos respectivos times.

Encontrar o quarterback da franquia, aquele líder que irá ocupar a posição mais importante do time e que vai ser a cara da equipe durante vários anos, seria equivalente a encontrar o Santo Graal no mundo do futebol americano. A busca por esse atleta pode deslanchar uma carreira ou acabar com ela. Encontre o quarterback certo, e tudo o que você fizer parecerá sempre muito inteligente. Escolha o errado, e é melhor você começar a atualizar o seu currículo. A cansativa e extensa busca pelo quarterback certo - juntamente com o medo de perdê-lo - vai se tornando uma neurose na cabeça dos dirigentes das equipes, confundindo e prejudicando o raciocínio até das mentes mais brilhantes no assunto.

De 1999 a 2011, 39 quarterbacks foram escolhidos na primeira rodada do draft, mas apenas 16 na segunda rodada.

Pense nisso: a distribuição destas escolhas, de uma rodada para outra, deveria ser proporcional. Mesmo que os times tendam a valorizar quarterbacks, eles deveriam aplicar esse raciocínio ao longo de todo draft.  Mas não é o que acontece. No draft, os times tem a preocupação de não deixar passar um possível quarterback de franquia na mesma intensidade com que se preocupam em não escolher um jogador que se torne um fracasso.

Para as demais posições, há vários outros atributos tangíveis que se pode avaliar: por exemplo, o wide-receiver X tem velocidade e habilidade tais que é coerente escolhê-lo na primeira rodada, enquanto o wide-receiver Y não é rápido o suficiente para justificar ser escolhido na primeira rodada. Mas com quarterbacks, a coisa é diferente. Muitos elementos são intangíveis, ou então muito difíceis de se fazer uma projeção. Considerando isso, e também pelo fato da pressão que muitos dirigentes das equipes sofrem para escolher o quarterback certo, resulta em que, se determinado atleta atende a alguns pré-requisitos básicos (altura, bom porte físico e braço forte), ele tende a ser escolhido na primeira rodada do draft, ainda que hajam dúvidas com relação a outras características (precisão no passe, postura profissional no dia-a-dia, liderança, etc) que poderiam fazer com que os times ficassem com receio.

Em 2008, tendo em mãos a primeira escolha do draft, o Miami Dolphins deixou de selecionar o quarterback Matt Ryan para selecionar o tackle Jake Long. Long é um tackle excepcional mas, quatro anos depois dessa escolha, o time teve quatro quarterbacks diferentes desde então, e ainda está desesperado por um quarterback de franquia. Em 2005, o Minnesota Vikings deixou passar Aaron Rodgers por duas vezes, selecionando nestas ocasiões o wide-receiver Troy Williamson e o defensive-end Erasmus James. Nenhum deles está mais na liga. E veja a situação do Minnesota e de Miami: o Vikings preencheu a posição de quarterback no draft do ano passado, selecionando Christian Ponder com a 12a escolha, enquanto o Dolphins está pensando em fazer o mesmo no draft deste ano, escolhendo Ryan Tannehill com 8a escolha*.

Necessidade é um péssimo negociador, e um ainda pior avaliador de atletas. Mas aquele frio na barriga pela possibilidade de selecionar alguém que possa se tornar um astro também é imenso. Este é o motivo pelo qual o Dolphins está preocupado se Tannehill ainda estará disponível na 8a escolha, e ao mesmo tempo preocupado se ele de fato vale uma 8a escolha. Outros times igualmente desesperados, como Seattle, podem também fazer uma troca para selecioná-lo antes da equipe de Miami.

Esse é o motivo pelo qual os dirigentes das equipes não dormem muito bem em abril.


Brian Billick é ex-técnico da NFL, e liderou o Baltimore Ravens ao título do Super Bowl de 2000. Ele foi treinador do Ravens durante 9 temporadas (1999-2007) depois de trabalhar no Minnesota Vikins como coordenador de ataque (1994-98). Além de escrever para a NFL.com, Billick é analista no NFL Network's Total Access e também em outros programas.

(*nota do tradutor: Ryan Tannehill foi selecionado pelo Miami Dolphins na 8ª escolha do draft)

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- Tradução livre de Marcos Koji Onodera

Conteúdo original em:
http://www.nfl.com/draft/story/09000d5d82857fcc/article/how-to-draft-a-qb-part-1-nobody-knows-anything

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